A dicotomia entre mente e corpo e sua influência no uso crescente de psicofármacos na atualidade

Palavras-chave: Medicalização. Transtorno mental. Unidade. Multiplicidade. Cérebro. Psicofármacos.

Resumo

O presente trabalho aborda o uso cada vez mais acentuado de psicofármacos para o tratamento de transtornos mentais. Entendemos esse fenômeno como parte de outro mais abrangente chamado medicalização, que pode ser descrito como a crescente influência da jurisdição médica sobre a vida humana e seus sofrimentos. Estes, que outrora faziam parte do ato mesmo de viver, têm sido capturados por explicações que os consideram como consequência de uma desordem localizada no corpo ou em órgãos específicos, como o cérebro, no caso de transtornos mentais. No nosso entendimento, o cerebralismo a que nos referimos, disseminado pelo discurso neurocientífico, pode ser entendido tanto pela análise das origens históricas do paradigma científico moderno que sustenta a medicina da forma como a conhecemos atualmente, bem como pela análise do modo de produção capitalista e pela sua ética do trabalho. Seguimos, então, as críticas nietzschianas, no que se refere à filosofia e ciência moderna como herdeiras da tradição filosófica socrática-platônica e do cristianismo. Dessa herança, o que mais nos importa é o desprezo por aquilo se que manifesta no corpo, diga-se afetos, desejos e multiplicidade, valorizando as características relacionadas à alma, tais como controle, razão e unidade.

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Publicado
2021-07-26
Como Citar
Mota, T. C., Melo, R. B. de, & Oliveira, F. B. de. (2021). A dicotomia entre mente e corpo e sua influência no uso crescente de psicofármacos na atualidade. Revista Scientiarum Historia, 1, 9. https://doi.org/10.51919/revista_sh.v1i0.306
Seção
Epistemologia, Lógicas e Teorias da Mente